sexta-feira, 12 de junho de 2015

UM ANO. NOSTALGIA BOLEIRA




















O encanto pelas letras nasceu cedo, ainda nos tempos em que, leitinho quente, pijama e cama, entre bocejos e antes do ‘boa noite, durma bem’, meus pais contavam histórias de mundos fantásticos, príncipes, fadas, meninas rebeldes, guerras e monstros. Criança, adorava escrever redações, mesmo quando não eram pedidas pela professora. Cercado pelas estantes, cotovelos apoiados no chão, mãos segurando o queixo, passava horas deitado no escritório do meu avô, entre caçadas de onças com bodoques, viagens ao céu e visitas ao reino das águas claras, embalado pelas invencionices maravilhosas de um tal José Bento Monteiro Lobato. A paixão pelo futebol, suspeito, manifestava-se já nos chutes de trivela na barriga da minha mãe, depois treinados à exaustão e aperfeiçoados nas tantas peladas disputadas nos times de escolas, no clube, nas praças, nas ruas, nas quadras de cimento, nos campos de areia e de terra batida, na sala do apartamento (o gol era a janela). Peladeiro profissional não nega jamais um futebol com os primos no quintal em ladeira da casa dos avós. Bicudinhos. Traves de tijolos. A briga era para ver quem atacava para baixo. Era preciso também driblar a casinha do cachorro (quase na linha de escanteio), a pitangueira e a árvore de araçá, sempre traiçoeira, a deixar as frutinhas caídas esparramadas pelo campo. Se a gente não tomasse cuidado, lá vinham escorregões e uns tombaços. Futebol e literatura. Palavras e bolas. O ponto de encontro desses dois amores – já que estamos no Dia dos Namorados? “Memórias de uma Copa no Brasil”. Filho legítimo das redes sociais. Começou como diversão despretensiosa. Mesa-redonda boleira virtual, a reunir amigos. Ganhou curtidas, comentários, retuitadas e compartilhamentos. #publicachico. #chiconarradoroficialdacopa. Vem comigo. Vale relembrar. Sinfonia de sotaques no metrô paulistano. Cidade fervilhando. Brasil estreia com vitória. Fortaleza. Impressionante Costa Rica. Quanto está o jogo da França? Aeroporto. Esteira das malas. Ônibus. Táxi. Trem expresso. Caminhadas. Que frio foi aquele no Itaquerão? A Fúria foi embora mansinha. Luisito Suárez resolveu arriscar beijinho no ombro do zagueiro italiano. Futebol moleque no saguão da universidade. Sonho de menino. Estádios com os irmãos. Estádios com os filhos. Messi, que golaço no Mineirão! Sofrimento nos pênaltis. Corrupção padrão FIFA. Volume morto da famiglia FIFA. Sai prá lá, pé frio. Mandingas e rituais. Manos boleiros. Não deu. Nem com a bênção dos deuses do futebol. Respira fundo, para não escrever impropérios no texto de 8 de julho. Vaza, Marin! Leva junto o Del Nero. Cinismo e arrogância. Confederação Brasileira de Falcatruas. Truculência das PMs na repressão às manifestações. O dever de todo brasileiro é torcer pela Alemanha na final. Um ano. Doze meses. 365 dias. 8.760 horas. Passou rápido demais. “Memórias de uma Copa no Brasil”. #publicachico. Crônicas. As boas histórias que só o futebol é capaz de revelar. Ironias e bom humor. Linguagem leve, reflexões profundas. Papo informal e cúmplice entre escritor e leitor. Na beira da piscina, hotel em Atibaia, férias de julho, ressaca copeira, entre a lembrança amarga de um e outro gol da Alemanha, mensagem pisca na tela do celular. “Chico, já pensou em publicar as crônicas num livro impresso?”. Um minuto de silêncio, embasbacado. Euforia. #publicachico. Publiquei. O livro, meu xodó. No lançamento numa noite chuvosa de 13 de dezembro, papai noel voando com seu trenó sobre nossas cabeças, Bar São Cristóvão, mais de 300 amigos reunidos, gente muito querida de todas as tribos – família, amigos do futebol, amigos de infância, do cursinho, da faculdade, das escolas dos meninos, professores, alunos, ex-alunos, amigos dos amigos. Transbordamento de afetos. Papo boleiro bacana e animado no lançamento na Livraria Martins Fontes, em fevereiro. Entrevistas para rádios, portais, sites especializados, jornais, sorteios em programas de televisão. É de arrepiar a empolgação curiosa e inteligente dos leitores mirins nas palestras que tenho feito em escolas, a me receber sempre com muito carinho. “Assina o meu caderno?”. Claro, com prazer. “Tira um foto comigo?”. Com certeza. “Você escrevia direto no computador? Era um texto por dia? A linguagem é formal ou informal? Por que são parágrafos longos? E as frases curtas? Qual a crônica que você mais gosta?”. Entrevistadores implacáveis. Nota dez para todos. Aprovadíssimos. Com louvor. Maioridade intelectual.  Contra a redução da maioridade penal. “Memórias de uma Copa no Brasil”. Acordei hoje com vontade danada de correr para a avenida Paulista. Será que encontro os mexicanos, os croatas, os holandeses, os argentinos, os chilenos, os camaroneses, os ingleses, os costarriquenhos? “Soy Celeste”. “Ticos”. “En-gland!”. “Maradona es más grande que Pelé”. “Chi-chi-chi-le-le-le”. Pulei da cama cantando “OOO-EEE-AAA!”. Já pode dar palpite para o bolão? Brasil ganha de 7 x 1. Cravei. Coloca a cerveja para gelar. Liga na ESPN Brasil. Em português, russo, inglês, francês, espanhol, italiano, dialetos africanos, japonês, babel de sotaques, agradeço mais uma vez e sempre a todos vocês, que me empurraram e abraçaram, que continuam a me incentivar, fazendo de “Memórias de uma Copa no Brasil” um dos momentos mais marcantes de minha vida. Sim, há um Chico antes de “Memórias” e outro Chico depois de “Memórias”. São muito diferentes. Sem exageros. Gratidão eterna. Vem mais por aí? Oxalá, tomara que sim. “Uma história se conta, não se explica”, já escreveu Jorge, o Amado. E há tanta história boleira para contar, tanta conversinha de futebol para registrar. Para além das Copas. #publicachico. A gente se reencontra em breve, nas arquibancadas literárias ou nas estantes futebolísticas da vida. #tamojunto. Abraços boleiros e fraternos do Chico Bicudo. 

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