sábado, 13 de junho de 2015

A ALEMANHA DE NOVO NO CAMINHO DO BRASIL

Na cidade de Temuco, no sul do Chile, onde estreia amanhã na Copa América contra o Peru, a Seleção Brasileira está hospedada no Hotel Dreams, que fica na avenida... Alemanha. Sonhos e Alemanha. Não combina. Talvez devesse o estabelecimento se chamar Nightmare. Corre à boca pequena que foi uma escolha pessoal do técnico Dunga. No melhor estilo militar "chega de bobagens infantis, aquilo já passou, é o melhor recomeço que poderíamos desejar, dez vitórias seguidas, somos homens feitos, profissionais, não tememos demônios passados", o atual comandante da Canarinho disse ter certeza que a experiência fará bem aos boleiros nacionais. "Olhar para a placa com o nome da rua vai fortalecer nossos brios de guerreiros. Somos machos, chê", disse aos dirigentes da Confederação Brasileira de Falcatruas, na hora de escolher a concentração. Parece não ter dado muito certo. Tentaram abafar, esconder, proibiram os atletas de dar declarações a respeito, mas o DataChico apurou que, já no desembarque, ao bater os olhos na palavrinha fatídica (A-LE-MA-NHA), Thiago Silva teve uma síncope. Desabou a chorar, inconsolável. Fernandinho começou a ouvir vozes. "Cuidado, olha o Kroos!. Solta a bola, olha o Özil!". David Luiz fez beicinho e começou a pedir desculpas, chacoalhando a vasta cabeleira e acenando para a galera que aguardava o esquadrão nacional. Entraram rapidinho no hotel, esquecendo malas esparramadas por todos os cantos. Sem perceber, deixaram um buracão no meio do saguão. Daniel Alves, tenso, olhava sem parar para a esquerda, para a direita, para a esquerda de novo, como se temesse ser surpreendido por algum alemão com camisa vermelha e preta. Deixou escapar, bem baixinho. "Minhas pernas estão tremendo. Sem alegria. Algém viu o Bernard?". Na recepção, momento do check-in, o funcionário sorridente tentou ser simpático e avisou: "o sétimo andar está todinho reservado para vocês. Ninguém vai importuná-los. Prometemos". Como? O quê? O número reverberou como uma bomba. Neymar tentou argumentar, encostou no rapaz do hotel e sussurrou algo, colocando a mão na boca para evitar leitura labial. Robinho até achou legal. "Me lembro das sete pedaladas que mandei no Rogerio na final do Brasileirão de 2002". A balbúrdia foi geral. "Sete? Sétimo?". Gritaria. Braveza. "No sétimo não dá. Não vou subir sete andares. Não vou apertar botão sete no elevador. Só pode ser sacanagem, armação", berrou Thiago Silva, aos prantos. Quando soube que o apartamento em que ficaria seria o 71, só conseguiu dar sete passos e sentar numa bola que estava encostada num canto e lá ficou, parado, inerte, a mirar o infinito. Dunga enfureceu-se. "Deixe disso, che. Seja homem. Nem mais capitão você é. E já sei que não posso contar contigo em cobrança de pênaltis. Levanta e anda".  O chefe da delegação, João Dória Junior, escolhido para o cargo por evidentes e relevantes contribuições oferecidas ao futebol e nada por critérios políticos, parecia uma barata tonta. Só conseguia repetir, abestalhadamente "é tudo culpa da Dilma, é tudo culpa do PT". Ficou falando sozinho. Argumenta daqui, contesta dali, acerta acolá (Gilmar Rinaldi gesticulava freneticamente, pedindo respeito ao futebol pentacampeão do mundo), o impasse foi finalmente resolvido. Todos transferidos para o décimo andar. Enquanto se preparavam para subir, aliviados, os boleiros da Seleção foram surpreendidos por uma carta que tinha chegado dois dias antes ao hotel e que desejava sorte ao Brasil no torneio. Assinado: dona Lúcia. Ela só lamentava, no final do texto, que Felipão não fosse mais o técnico. Foi quando um torcedor chileno conseguiu furar o bloqueio de seguranças. Aproximou-se de Willian já berrando. "Vocês tiveram sorte, muita sorte. Deveriam ter saído antes da Copa. E aquela bomba no travessão do Julio Cesar nas oitavas, hein, aos quinze do segundo tempo da prorrogação, no Mineirão?". Neymar largou as malas no chão. Fez menção de partir para cima do hermano, que precisou ser escoltado até a rua. O nome da arena ecoou forte pelo saguão. MI-NEI-RÃO. MI-NEI-RA-ÇO. Thiago Silva soluçava, amparado pelo ombro de Jeferson, que tentava sossegar o zagueiro. "Tudo bem, tudo bem. Já passou. Você nem estava em campo. Calma". A muito custo, a algazarra só seria controlada uma hora depois. Todos finalmente recolhidos, acomodados em seus quartos. Quando foi fechar a cortina, Fernandinho bateu sem querer o olho na placa da rua. Iluminadíssima. AVENIDA ALEMANHA. O médico foi chamado. O volante só conseguiu dormir sob doses cavalares de calmante. Às três da madrugada, o silêncio foi brusacamente interrompido pelos toques dos telefones nos quartos, um a um, em sequência. 1010, 1011, 1012... O funcionário da recepção avisava aos que atendiam sonados. "Senhores, tivemos repentina queda de energia. Pedimos desculpas. Acabou a luz". David Luiz saiu correndo, tresloucado. "Apagão! Apagão! Apagão!". Tropeções, empurrões, quedas nas escadas, portas de incêndio chutadas, urros guturais. "De novo não! Apagão de novo não!". Reuniram-se todos no térreo, decididos a exigir a mudança de hotel. "Aqui não vamos ficar". Foi quando notaram a ausência de Thiago Silva. Foi encontrado no final do corredor do sétimo andar, pálido, sentado numa bola. Catatônico. Olhando para o número do quarto. 71.

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